Vitor Debona

Uma nova pesquisa publicada na Revista Biodiversidade Brasileira (vol.15, n 2, 2025) do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), trouxe descobertas importantes sobre o papel ecológico da erva-mate (Ilex paraguariensis) nos ecossistemas sul-brasileiros. Realizado em fragmentos de floresta com araucária no norte do Rio Grande do Sul, o estudo revelou que a erva‑mate é a árvore mais visitada por aves frugívoras — tornando-se uma das principais responsáveis pela manutenção da avifauna e pelos processos naturais de regeneração florestal.

Entendendo a pesquisa 

 Entre 2011 e 2019, a equipe de pesquisa conduziu 1.080 horas de observações diretas em 36 árvores de 12 espécies arbóreas. Utilizando binóculos e métodos de observação focal durante as manhãs, foram registradas informações como espécies visitantes, tempo de permanência, comportamento alimentar e dispersão de sementes.

 A Erva-mate liderou com folga a preferência das aves: foi a mais visitada e consumida, com 1.859 frutos ingeridos em 320 visitas. Espécies como o sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris), sabiá-barranco (Turdus leucomelas) e sanhaço-cinzento (Thraupis sayaca) se destacaram no consumo dos frutos. Nove espécies foram identificadas como potenciais dispersoras, ao ingerirem os frutos inteiros — o que reforça seu papel crucial na reprodução natural da planta.

  Segundo a pesquisadora Gabriela Rodrigues, uma das autoras do estudo, essa preferência das aves pela Erva - mate se deve a múltiplos fatores:

  “A frutificação da erva‑mate ocorre em períodos estratégicos, servindo como uma fonte alimentar valiosa mesmo em épocas de escassez. Seus frutos contêm taninos, compostos que, apesar de adstringentes, são bem tolerados por aves frugívoras (aves que se alimentam de frutas) especializadas. Isso indica uma possível coevolução entre planta e dispersores naturais”, explica.

  A combinação entre valor nutritivo, acessibilidade dos frutos e adaptação das aves a compostos químicos torna a erva‑mate um recurso privilegiado na dieta da avifauna.

  Uma Aliada da Biodiversidade

Gabriela reforça que a Erva‑mate vai muito além de seu valor econômico:

“Ela é uma ponte ecológica entre as aves e a vegetação, facilitando interações que sustentam os processos naturais da floresta. Sua presença ajuda a manter populações de aves frugívoras e promove a conectividade entre fragmentos, mesmo em áreas já alteradas.”

 A pesquisadora destaca que espécies nativas ainda são pouco estudadas sob a ótica de sua importância ecológica:

“Precisamos entender mais profundamente o papel dessas árvores na regeneração das paisagens florestais. A erva-mate, por exemplo, é uma espécie-chave — e esse aspecto costuma ser negligenciado.” 

  Um símbolo cultural que sustenta a vida

``A principal mensagem deixada pelo estudo é que as árvores e aves formam uma rede ecológica vital. Quando protegemos espécies como a Erva‑mate, estamos preservando toda uma cadeia de vida que sustenta o equilíbrio dos ecossistemas e das comunidades humanas”, finaliza Gabriela.

  Essa nova perspectiva reforça a importância de integrar o conhecimento científico com políticas públicas, práticas de manejo sustentável e valorização cultural. A erva‑mate, símbolo regional do Sul do Brasil, prova que tradição e conservação podem caminhar juntas.

O estudo completo pode ser conferido em: https://doi.org/10.37002/biodiversidadebrasileira.v15i2.2610